As negociações de Trump e Putin no Alasca: o que esperar a partir de agora
19/08/2025 às 10:22
Foto: reprodução

por Priscila Caneparo
O encontro entre Donald Trump e Vladimir Putin na última sexta-feira, no Alasca, marca um capítulo singular na política internacional, não apenas pela simbologia histórica, mas também pelas implicações estratégicas. Vale lembrar que todos os presentes já haviam se reunido em fevereiro, na Arábia Saudita, com o propósito de discutir os caminhos para a paz na Ucrânia, ainda que, desta vez, o enviado especial dos Estados Unidos para a Ucrânia não tenha participado das conversas. A ausência foi notada, especialmente porque a guerra permanece em estado de estagnação militar, com a Rússia mantendo controle sobre cerca de 19% do território ucraniano, incluindo áreas cruciais como Crimeia, Donetsk, Luhansk, Zaporizhzhia e Kherson, o que reforça a dificuldade de qualquer perspectiva imediata de resolução definitiva do conflito.


Outro ponto central que pautou as discussões foi o futuro do tratado START, responsável pelo controle mútuo de armas nucleares entre Washington e Moscou. Originalmente firmado em 1991, entre Gorbachev e Bush, e renovado em 2010, por Obama e Medvedev, o acordo expira em 5 de fevereiro do próximo ano e sua continuidade é incerta. O tratado estabelece limites tanto quantitativos quanto qualitativos para os arsenais nucleares, funcionando como uma das principais salvaguardas da segurança global. A aproximação entre Trump e Putin, nesse contexto, pode indicar uma tentativa de redefinição de termos que garantam maior flexibilidade, mas ao mesmo tempo levanta dúvidas sobre a real disposição de ambos em manter mecanismos de verificação e transparência.

O encontro também revelou interesses mais pragmáticos. Os Estados Unidos demonstraram disposição em discutir a viabilidade de uso de navios quebra-gelo movidos a energia nuclear em projetos de exploração de gás no Alasca. O tema conecta geopolítica, segurança energética e desenvolvimento regional, além de representar uma área em que os dois países podem vislumbrar cooperação, a despeito das tensões. O simbolismo geográfico do encontro não pode ser ignorado: o Alasca foi comprado pelos EUA em 1867, e esta foi a primeira vez, desde então, que um chefe de Estado russo visitou o território, um gesto carregado de peso histórico.

Outro detalhe simbólico foi a aeronave que levou Putin ao Alasca, um avião totalmente desenvolvido pela indústria russa, projeto iniciado ainda nos anos 1980 e fortalecido recentemente devido às sanções impostas ao país, que restringem o acesso a peças estrangeiras para a aviação. A escolha da aeronave funciona como demonstração de autossuficiência tecnológica em meio ao isolamento econômico e político que a Rússia enfrenta desde 2022. No campo doméstico, Trump não perdeu tempo em explorar o encontro politicamente. Ainda durante o final de semana, disparou e-mails de arrecadação de fundos para sua campanha, com a frase: 'ninguém no mundo sabe como fazer acordos como eu!', buscando transformar a negociação em capital político direto junto a sua base.

A partir de agora, as expectativas giram em torno de três eixos principais: se haverá abertura real para avanços nas negociações sobre a paz na Ucrânia, ainda que parciais; se será possível renovar ou reinventar o tratado START em um contexto de crescente desconfiança mútua; e até onde o pragmatismo econômico, simbolizado pelos projetos energéticos no Ártico, poderá se sobrepor à rivalidade estratégica. O encontro no Alasca não encerra impasses, mas funciona como indicativo de que ambos os líderes reconhecem a necessidade de manter uma linha de diálogo em meio a uma ordem internacional cada vez mais fragmentada.
 
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