
Foto de byMATTER MADE BETTER na Unsplash
por Luiz Felipe Leprevost
Cafuné é sopro da manhã que move as cortinas do quarto. Cafuné é chaleira que canta. Cafuné sabe caminhos no corpo antes mesmo do toque.Cafuné é esbarrão leve na cozinha que vira abraço. Cafuné é cabeça no colo. Cafuné é água nascente, fio de arrepio no pescoço, sussurro gotejado na nuca. Cafuné mora nas orelhas. Cafuné é o enlace pela cintura. Cafuné é o frio que desaprende o inverno ao encostar em alguém. Cafuné passeia a pele. Cafuné são dedos lavrando, plantando calma no terreno da fadiga. Cafuné é o roçar leve no pé cansado. Cafuné é silêncio entre dois que se entendem. Cafuné é abir os cheiros dos corpos. Cafuné é baile inocente podendo dar em culminâncias. Cafuné é de prosear baixinho, segredo no vento, riso entre lençois. Cafuné é banho quente. Cafuné é a meia encontrada no fundo da gaveta. Cafuné é varanda, fim de tarde preguiçosa, rede que embala com mãos de brisa e demora. Cafuné é galho de jabuticaba encostando na infância. Cafuné é sabugueiro, raiz sonhando alto, tateando estrelas. Cafuné são lentos faróis incendiando-se entre as castanheiras. Cafuné é dália se abrindo na alma cansada. Cafuné é zum zum de abelha. Cafuné é o jasmim dos poetas começando a cheirar. Cafuné é telhado em chuva mansa. Cafuné é de cheirar, é de comer, fruta madura, bafo de pão no forno, café recém passado. Cafuné é palavra dita sem levantar a voz. Cafuné é mão de avó na cabeça rezando. Cafuné é bichinho polimorfo, manso, selvagem. Cafuné é passarinho que cisca mapas de carinho antigo. Cafuné é gato arqueando ronronos. Cafuné é cãozinho espreguiço deitando de barriga para cima. Cafuné é criança na casa, chão da sala com brinquedo espalhado. Cafuné é o cheiro azedinho do filho na gola da camiseta depois da escola. Cafuné é a mochila da menina com farelo de biscoito. Cafuné são as perguntas que só as crianças sabem fazer sem quebrar o mundo. Cafuné é ler um livro, costura invisível entre um mundo e outro. Cafuné é pausa na correria. Cafuné é um "tô aqui" só com o olhar. Cafuné é respiração perto. Cafuné é viajar ali pertinho. Cafuné é pontinha do indicador, do médio e do polegar desenhando paz no rosto alheio. Cafuné é se deixar levar entre caracóis do sono, é colo que não pergunta a hora. Cafuné é inteligência singular. Cafuné é o “dorme bem” com voz de travesseiro. Cafuné é coberta puxada para cobrir o outro no meio da noite fria. Cafuné é fósforo clareando o que se esconde na dobra entre o cansaço e o sonho. Cafuné é o lar que a gente leva dentro. Cafuné é norte em noite sem chão, bússola de dedos e alívio. Cafuné é pelo que os viventes são mais devotos. Vai lá. Faz cafuné no seu amor. Diga nada não, o cafuné fale por si. Todo mundo tem uma coisa que só acalma quando o afeto toca.