Resolução Contratual após registro de escritura pública: Análise do REsp 2172231/MG
27/06/2025 às 07:34
Foto de Milos Lopusina na Unsplash
por DEBORA DE CASTRO DA ROCHA

No julgamento do Recurso Especial nº 2172231/MG, o Superior Tribunal de Justiça reafirmou entendimento relevante em matéria contratual e de defesa do consumidor: o registro da escritura pública de compra e venda de imóvel não impede a resolução contratual quando há inadimplemento de obrigações acessórias pactuadas. No caso analisado, embora a transferência da propriedade do imóvel tenha ocorrido formalmente por meio do registro, o STJ reconheceu que a ausência de infraestrutura no loteamento configura descumprimento contratual suficiente para a rescisão e restituição dos valores pagos pelos compradores.
Os adquirentes haviam firmado contrato de compra e venda com a promessa de que o imóvel seria entregue com todas as obras de infraestrutura concluídas. Apesar do pagamento integral do preço e do devido registro, essas obras não foram executadas pela empresa responsável, inviabilizando o uso efetivo do bem. A ação proposta buscava a resolução do contrato, indenização pelos danos materiais e a obrigação de fazer, obtendo êxito em primeiro grau. Entretanto, o Tribunal de Justiça local entendeu que a existência do registro tornava o contrato irretratável, reformando a sentença e afastando a possibilidade de rescisão.
Ao analisar o recurso especial, a Terceira Turma do STJ entendeu de forma diversa. A relatora apontou que o contrato não se extingue com o registro da escritura quando há cláusulas ainda não cumpridas. Com base nos artigos 475 do Código Civil e 18, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, destacou que o inadimplemento relativo à ausência de infraestrutura configura falha grave na prestação do serviço, violando o princípio da boa-fé objetiva e autorizando a resolução do contrato com o retorno ao status quo ante.
A decisão esclareceu que o registro da propriedade é apenas parte do cumprimento do contrato e não exonera o vendedor do cumprimento de demais obrigações contratuais. A Corte determinou a restituição integral das quantias pagas, incluindo valores relativos a tributos, corretagem e multa contratual, e ainda ordenou a retificação do registro imobiliário para que o imóvel voltasse à titularidade da empresa vendedora. Assim, restabeleceu-se a sentença de primeiro grau em favor dos consumidores lesados.
O entendimento da Corte busca consolidar a jurisprudência protetiva ao consumidor, que impede que a formalização registral seja utilizada para legitimar o descumprimento contratual. Trata-se de uma importante reiteração do princípio de que o contrato só se considera cumprido quando todas as obrigações pactuadas forem efetivamente executadas. Para os operadores do Direito, a decisão representa um sinal claro de que o STJ não admite soluções formais que desconsiderem a substância e a finalidade da relação contratual.
 
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