Audiência histórica na Itália discute se cidadania italiana precisa ter vínculo com o país
25/06/2025 às 08:16
Tribunal Corte em Roma
Nessa terça-feira, 24 de junho, o Tribunal Constitucional da Itália realizou uma audiência que pode mudar o entendimento sobre quem tem direito à cidadania italiana. Pela primeira vez, os juízes da mais alta corte do país avaliaram se o princípio do ius sanguinis — ou “direito de sangue” — está de acordo com a Constituição Italiana, especialmente quando aplicado sem limites de gerações e sem exigência de vínculo com o território italiano.

O julgamento é histórico e muito esperado, principalmente por milhões de descendentes de italianos ao redor do mundo, como no Brasil, onde se estima que mais de 30 milhões de pessoas tenham origem italiana e busquem esse reconhecimento. A audiência já ocorreu, mas a sentença ainda não foi publicada — e é ansiosamente aguardada pelos milhares de descendentes italianos que acompanham o processo com grande expectativa.

O que está em jogo
A discussão chegou à Corte Constitucional por meio de tribunais regionais — entre eles os de Bolonha, Roma, Milão, Veneza e Florença — que questionaram a legitimidade do ius sanguinis irrestrito. Conforme a legislação atual, prevista na Lei nº 91/1992, o direito à cidadania pode ser transmitido por descendência direta, mesmo após várias gerações.

Nova lei agrava cenário
A audiência ocorre em um momento especialmente sensível: em março de 2025, entrou em vigor a nova Lei nº 74/2025, também conhecida como “Decreto Tajani”, que restringe o direito à cidadania italiana apenas a filhos e netos de italianos nascidos na Itália. Em certos casos, a nova norma também exige que o ancestral tenha tido exclusivamente a cidadania italiana ou que o requerente tenha residido na Itália.

Para a ex-parlamentar italiana e advogada internacional Renata Bueno, que acompanha o processo de perto, as mudanças causam insegurança jurídica e preocupam as comunidades italianas no exterior. “Essa legislação está sendo questionada por violar princípios constitucionais, principalmente porque afeta processos já em andamento e ignora o direito adquirido dos descendentes que já iniciaram seus trâmites conforme a lei anterior”, afirma.

Embora a audiência de hoje não tenha sido especificamente sobre a nova legislação, a decisão do Tribunal poderá abrir precedente. Caso a Corte declare o ius sanguinis irrestrito como incompatível com a Constituição, a nova lei ganha força. Se, por outro lado, o tribunal confirmar a validade do modelo anterior, as novas restrições poderão ser contestadas judicialmente.

Decisão que pode reverberar por décadas
“O que está sendo decidido em Roma vai muito além de um parecer jurídico. É sobre como a Itália reconhece sua história, sua diáspora e os vínculos com os milhões de descendentes espalhados pelos cinco continentes”, avalia Renata Bueno. Ela defende que o ius sanguinis é mais do que uma norma legal: “É uma afirmação da identidade e da contribuição histórica dos italianos no exterior para o desenvolvimento da própria Itália”.

A sentença ainda não tem data definida para ser publicada, mas deve ter impacto duradouro nas políticas de reconhecimento de cidadania. Enquanto isso, a comunidade ítalo-descendente permanece em alerta. “Mais do que um direito individual, esse julgamento simboliza o elo entre passado e futuro da nação italiana”, assinala Renata Bueno.
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