Terror legal
24/06/2025 às 17:19
por Sérgio Odilon Javorski Filho
 
               Em tempos de guerra, sofrem os Estados, os povos e o Direito Penal. A legalidade, por natureza dedicada à proteção de direitos individuais contra o poder estatal, converte-se em legitimação de atrocidades.
Com o afastamento dos limites éticos e morais, o ordenamento distancia-se dos direitos humanos e torna-se instrumento de barbárie. A lógica do regime nazista, condicionado à interpretação dos textos legais conforme os interesses do Terceiro Reich, foi criar leis de exceção, redução e suspensão de garantias processuais, medidas extrajudiciais, censuras, dentre outras medidas de restrição e perseguição, com o objetivo de exercer total controle social.
No mesmo tempo em que mísseis são disparados em direção aos adversários políticos, argumentos vazios de autoridade são deflagrados intermitentemente dentro das fronteiras da nação belicosa, de forma a envolver o povo na trama abjeta que, sob o argumento de proteger, fere, vilipendia, adoece, elimina, maltrata e humilha.
Se a Segunda Guerra Mundial foi movida pela propaganda, em tempos de internet, com a comunicação instantânea, a guerra ganha contornos virtuais. Cooptados das camadas mais indigentes e ignorantes das sociedades, os soldados continuarão travando batalhas em solo, porém como coadjuvantes em um cenário no qual um botão pode causar a destruição em massa de seres humanos e eliminar do mapa nações inteiras sem deixar rastros de sua existência.
De sujeito de direitos, o cidadão passa a ser monitorado como possível inimigo, razão porque deve manter-se condicionado a reverenciar as arbitrariedades praticadas por governantes interessados diretamente no conflito bélico para aumentar seu poder, perseguir adversários políticos e dominar mais territórios e povos.
               Juízes, procuradores, promotores, delegados, policiais, advogados, funcionários públicos, serventuários e demais integrantes do sistema judicial, simplesmente ninguém está a salvo das intentadas do déspota e de seu partido para que se transformem em agentes de execução das vontades e das manipulações legais favoráveis à validação, à chancela e aos mandos e desmandos do grupo detentor do poder absoluto.
               De um vértice, minimizam-se direitos fundamentais. De outro, alarga-se o campo de imposição das leis, recrudesce-se as penas, edita-se normas com violações formais e materiais, de caráter excepcional, neutraliza-se críticos, imprensa e opositores, fragiliza-se a segurança jurídica, até que a vida dependa de manter-se calado. Neste novo mundo, o silêncio torna-se a arma de proteção e manutenção da sobrevivência.
               Cada clique no computador, celular ou tablete significa um passo a mais para o terror legal. A sensação distorcida de pertencimento ao grupo dominante subverte e domina. Jovens sem propósito ceifam as vidas uns dos outros. Longe do campo de batalha, canalhas já de cabelos brancos celebram com charuto e whisky. Enquanto isso, “Novas viúvas, cada manhã, gemem de dor, novos órfãos soluçam, novas dores abalam a face dos céus [...]” (Hamlet, Shakespeare).
 
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