Integralização de bens em holding e o entendimento do STJ que redefine a incidência do ITCMD: especialista alerta para impactos no planejamento sucessório
28/05/2025 às 11:30
Na foto, a advogada atuante em Direito de Família no escritório Assis Gonçalves, Nied e Follador – Advogados, Eloise Caruso Bertol. Créditos da foto: Micheli Iwasaki
Nos últimos anos, o planejamento patrimonial e sucessório tem se consolidado como ferramenta essencial para empresas familiares no Brasil. Com o objetivo de organizar o patrimônio e garantir uma transição segura entre gerações, muitos grupos optaram pela criação de holdings familiares — estruturas jurídicas destinadas a centralizar a gestão de bens e facilitar a sucessão sem recorrer a processos de inventário longos e dispendiosos.
A advogada atuante em Direito de Família no escritório Assis Gonçalves, Nied e Follador – Advogados, Eloise Caruso Bertol, explica que essas sociedades permitem que indivíduos transfiram seus bens — como imóveis, dinheiro e participações societárias — para o capital social da empresa. Em seguida, as cotas da holding podem ser doadas aos herdeiros, garantindo uma administração mais eficiente e protegida do patrimônio. “Uma das vantagens dessa estratégia está na possibilidade de integralizar bens imóveis pelo valor histórico declarado no imposto de renda, com respaldo no artigo 23 da Lei nº 9.249/95, além da imunidade ao ITBI prevista na Constituição Federal, exceto nos casos em que a atividade preponderante da empresa seja a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição, conforme arts. 36 e 37 do Código Tributário Nacional”, comenta.
Entretanto, a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Recurso Especial nº 2.139.412/MT, trouxe preocupação ao alterar a interpretação vigente sobre a base de cálculo do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação). “O STJ entendeu que o tributo deve incidir sobre o valor de mercado dos bens transferidos à holding, e não sobre o valor contábil das cotas sociais, gerando, assim, um impacto direto na carga tributária de quem opta por esse modelo de planejamento”, explica Eloise.
A advogada afirma que a decisão representa um risco para quem realizou planejamentos recentes. “Cada estado tem autonomia para definir a base de cálculo do ITCMD. O STJ, ao desconsiderar isso, gera insegurança jurídica e desestrutura planejamentos construídos com base na legislação vigente”, reforça. “É preocupante perceber que o STJ se apoiou em dispositivos do Código Tributário Nacional que não se aplicam diretamente à matéria estadual, e em precedentes oriundos de outras regiões com contextos legais distintos, como São Paulo e Mato Grosso do Sul. Isso viola a autonomia dos estados e compromete a estabilidade de um sistema que já estava em funcionamento”, afirma.
Vale ressaltar que a decisão da 2ª Turma do STJ ainda está pendente de julgamento definitivo, pois foram apresentados embargos de declaração. Mesmo assim, o precedente causa apreensão entre advogados tributaristas e famílias que investiram em estruturas legais para preservar seu patrimônio. “Se o objetivo é estimular a continuidade das empresas familiares, o caminho não pode ser o da tributação desproporcional e do desequilíbrio jurídico. Não há proveito econômico direto na integralização de bens, pois não é uma venda, mas uma reorganização. É preciso cautela para não inviabilizar soluções legítimas de proteção patrimonial”, conclui Eloise.
 
Como será cobrado o ITCMD após decisão do STJ
A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Recurso Especial nº 2.139.412/MT, alterou significativamente a forma como deve ser calculado o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) em operações de planejamento sucessório envolvendo holdings patrimoniais. “Até então, era comum que os contribuintes fizessem a doação de cotas ou ações de holdings familiares com base no valor contábil dos bens integralizados, ou seja, o valor registrado no balanço da empresa - geralmente inferior ao valor de mercado. Essa prática tinha respaldo em legislações estaduais e objetivava permitir uma transição patrimonial mais fluida e menos onerosa”, comenta a advogada.
Com o novo entendimento do STJ, o ITCMD passará a ser exigido com base no valor de mercado dos bens que foram integralizados na holding (como imóveis, por exemplo), e não mais com base no valor contábil das cotas sociais doadas. Isso significa que o imposto poderá ser significativamente mais alto, mesmo que a operação não envolva qualquer ganho financeiro imediato.
 
O que muda
1 - Doações de cotas de holding passam a ser analisadas com base no valor dos bens subjacentes (especialmente imóveis), o que pode levar à reavaliação do imposto devido com base no valor venal de mercado.
2 - Estados poderão questionar planejamentos anteriores, solicitando complementações de ITCMD caso considerem que houve subavaliação dos bens.
3 - Mesmo que a legislação estadual preveja o valor contábil como base de cálculo, a decisão do STJ cria um precedente que poderá ser usado pelas fazendas estaduais para aumentar a fiscalização e cobrar o tributo com base no valor de mercado.
4 - A insegurança jurídica aumenta, pois a autonomia dos estados prevista no artigo 155 da Constituição Federal está sendo relativizada por uma interpretação do STJ que se sobrepõe à legislação local.
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