
Rubens Hering
O Brasil está letárgico e em estado de choque. Mais de 6 bilhões de Reais é o produto do assalto contra cerca de 9 milhões de aposentados e pensionistas do INSS. O Estado brasileiro prestou serviços a ladrões por contrato. Lhes deu acesso aos benefícios de aposentadorias oportunizando o surrupio de valores bilionários.
As vítimas são os mais pobres, os velhinhos, as viúvas, os órfãos, os inválidos, os analfabetos, esses todos muito vulneráveis. Isso é crime maior e mais infame do que os havidos na Lava Jato. O “modus operandi” foi o INSS realizar desconto em folha de pagamentos de mensalidades de Associações, muitas dessas fantasmas e algumas ligadas a sindicatos. É estarrecedor que o INSS, justamente o guardião e fiel depositário dos interesses dos aposentados, tenha permitido que instituições picaretas estendessem suas “longa manus” em contracheques de aposentadorias e pensões.
Assim, o Estado é no mínimo cúmplice desse indébito. A aposentadoria é instituição sagrada e intocável. Mas, esse princípio foi quebrado pelo estabelecimento de um conúbio de tenebrosas transações desse Órgão estatal com tais Associações, essas eventualmente apadrinhadas por políticos de alta patente ainda por serem identificados. Até o momento, o que se vê em Brasília é batimento de cabeças e troca de acusações entre governo versus oposição. Estão perdidos e não sabem o que fazem para reparar o descalabro. Fala-se em simplesmente devolver o dinheiro afanado a quem reclamar.
Serão uma minoria os reclamantes. Não se sabe como nem de onde virá tanta grana. E pior, não é correto só devolver o valor surripiado. É em dobro a devolução devida. Trata-se de apropriação indébita de dinheiro privado em venda de serviços que não entregam. Se indébito é, manda a Lei de Defesa do Consumidor - LDC, em seu Art. 42, que a devolução seja em dobro e acrescida de correção monetária e juros legais. Estão estabelecendo prescrição dos indébitos em 5 anos. Outra infâmia. Indébitos civis prescrevem em 10 anos de acordo com o Art. 205 do Código Civil. É farta a jurisprudência trabalhista e cível nesse sentido. Estão anistiando os criminosos às custas dos direitos e do couro dos já lesados.
Além do que, para o prometido reembolso, são submetidos a um filtro seletivo em processo digitalizado infernal, ao que poucos tem acesso e domínio. O vilipêndio aos vulneráveis se seguirá, agora com chancela oficial do INSS e das autoridades constituídas. Se a devolução for simples ou meramente corrigida como se encaminha, os usurpadores que já aplicaram e usufruíram desse dinheiro estarão fazendo devolução apenas parcial dos lucros já obtidos às custas dos lesados. Se remediará o golpe havido com outro golpe em curso.
De dano moral nem se fala, afinal, na cabeça dessa gente amoral, a fome dos pobres não é dano moral. O que encaminham no Distrito Federal como pseudossolução anunciada é conceder anistia antecipada aos ladrões. Além disso, não se espere que à luz do que houve na Lava Jato, no Mensalão, etc., que agora se tenha algo diferente do que a punição permanente das vítimas e o perdão total ou parcial dos seus salteadores. Nesta república cleptocrática cadeia é só para os pobres. Ao fim, a pergunta que se faz é: estivessem os mentores e os ricos beneficiários da roubalheira anterior havida na Petrobrás e apurada na Lava Jato, amargando uns 20 anos de cadeia, haveria ainda assim a atual fraude contra os aposentados do INSS? Creio que não...
*Rubens Hering é economista. Foi diretor dos grupos Bamerindus e HSBC na área de Seguros e Previdência. Exerceu cargo de Ouvidor da ParanáPrevidência. Hoje faz consultoria em Previdência Privada.