
Por Luiz Felipe Leprevost
Início dos anos dois mil. Eu era estudante, um garoto ávido por cultura. Estava descobrindo os encantos da noite Curitibana. Fui parar no Bar do Tatara, numa ruazinha erma das Mercês. O estabelecimento funcionava nos fundos de uma casa de bairro desbotada sem qualquer atrativo na fachada.
Naquela noite, o dono do bar, um homem barbudo e cabeludo, pediu licença ao músico, subiu no palco e declamou um poema com dramaticidade. Os versos diziam algo como “vem por aqui”, “não, não vou por aí”.
Na sequência, o poeta pegou o violão e tocou alguma de suas canções. Eram absolutamente originais, com harmonias diferentes de qualquer outra coisa que eu conhecia. As letras eram poéticas e acessíveis.
O principal atrativo daquele bar era aquele bardo. Alguns anos depois, o bar mudou de endereço.
Um dia Tatara me ligou empolgadíssimo. Pediu que eu fosse lá. Acompanhados do violonista Cabelo (seu grande parceiro de canções e de palco), listamos uns quarenta nomes de músicos, cancionistas e poetas que, acreditávamos, se engajariam no projeto sugerido por Cabelo, inspirado no que Zé Rodrix vinha fazendo em São Paulo.
Ficou combinado que as reuniões se dariam nas segundas-feiras, o violão rodaria e artistas apresentariam canções autorais. O bar do Tatara, além do espaço, ofereceria sopa. Poucos encontros depois, não sendo possível mais manter a coisa em roda, dado o sucesso, decidiu-se que as apresentações de dariam no palco do bar.
Essa época coincidiu com minha mudança para o Rio, então acabei não acompanhando o início da segunda fase das Segundas Autorais. E estive poucas vezes por lá nos anos seguintes. Eu não tinha mais a mesma capacidade física e emocional de sustentar uma boêmia em plena segunda-feira.
Este projeto da velha dupla Cabelo e Tatara (diga-se com justiça) virou algo indescritivelmente potente. Nunca antes os cancionistas de Curitiba tiveram espaço de troca tão intensamente anárquico e eclético, livre de quaisquer preconceitos.
Nas Segundas Autorais, além do próprio Tatara, muitos compositores e cantores fizeram história. Em suas muitas fases, a atuação e o protagonismo dessas ou daquelas pessoas foi variando, os violões mudando de mãos, os microfones mudando de vozes. Houve muitas pessoas de suma importância para essa história. Grandes amizades e parcerias se deram graças a esse ambiente. Além das canções e da poesia de Tatara, a Segunda Autoral é parte indissociável do seu legado artístico. Ao seu jeito, formou e deu oportunidade a um incontável número de artistas.
Hoje, sem dúvida, milhares de pessoas conhecem suas composições. Existem muitos vídeos no YouTube com Tatara em ação. Muitas de suas canções foram gravadas por outros intérpretes e por ele próprio.
Como diz um verso de sua canção Manhê: “não faça por nada, a não ser por amor.” E foi o que o Tatara fez.